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Marcos Hinke & Jaqueline M. Souza

O Paradigma do Roteirista: Usar ou Não Paradigmas de Roteiro?


Falar de paradigmas narrativos (ou sintagmas narrativos) em escrita de roteiro pode ser visto como um insulto para muitos roteiristas. Esses consideram que a originalidade deve estar presente em todas as etapas do processo de criação e estruturação da história, associando o uso de paradigmas com falta de criatividade ou a uma receita de bolo em que só se muda a medida dos ingredientes. Para outros, parece que não existe outra forma de se contar uma história a não ser seguindo uma estrutura já definida e estabelecida, enxergando os paradigmas como dogmas que obrigatoriamente devem permear a estrutura narrativa.

Uma coisa que podemos concordar em relação a essas duas formas de pensar é que ambas estão erradas sobre um detalhe: paradigmas não são receitas exatas, mas sim modelos estruturais baseados em estudos.

Todo paradigma narrativo parte de uma pesquisa, ou seja, eles só são percebidos e nomeados através de uma análise de diversas histórias bem sucedidas anteriormente. São utilizados por roteiristas, autores e teóricos para auxiliar na compreensão de como funciona ou pode funcionar uma estrutura dramática.

Quando Joseph Campbell introduziu o conceito do Monomito em 1949 (ou “Jornada do Herói”) no livro “O Herói de mil faces”, seu objetivo não era propiciar uma lista de regras necessárias para se contar uma boa história, mas sim catalogar padrões narrativos presentes em mitos de diversas culturas através de milhares de anos. Cristopher Vogler adaptou o monomito para o cinema quando era consultor da Disney e logo o memorando de 7 páginas se popularizou e extrapolou os Estúdios Disney, até virar livro: “A Jornada do Escritor”.

George Lucas revelou ser um grande fã da obra de Campbell e que se inspirou na Jornada do Herói para arrematar o roteiro de sua saga espacial. Porém, mesmo já tendo conhecido a obra de Campbell anteriormente, foi só depois de ter escrito duas versões do roteiro de Star Wars que Lucas recorreu aos passos da jornada do herói para delimitar a narrativa dentro do universo que ele havia concebido.

E ainda hoje, muito acreditam que a Jornada do Herói é o único ou maior paradigma do cinema contemporâneo. Mas erram. Os passos apontados por Campbell em 1949 já traziam muitas similaridades com os sintagmas e funções propostas por Vladimir Propp na análise dos contos de fadas russos em 1928. O dramaturgo Gustav Freytag no século 19 já propunha uma estrutura dramática “A Pirâmide de Freytag”, utilizada amplamente nos tempos atuais em peças de teatro e filmes. Syd Field bebeu na fonte de Aristóteles e desenvolveu “A estrutura de três atos” estipulando os plot points em diversos filmes de sucesso do cinema americano. Robert Mckee em Story fala em “A Busca” e “Plot Central”, estruturas que descrevem o fluxo do conflito da história. “Beat by Beat” de Blake Snider é tão formulaico com seus beats calculados quase matematicamente que ganhou legiões de seguidores e detratores pelo mundo. “A Espinha da História” de Linda Sieger reflete muito bem sobre as obras multiplot e estuda a presença de tramas concretas e abstratas. Michael Hauge também propõe uma estrutura pensada para a jornada externa e interna do protagonista , estrutura que se tornou a mais utilizada nos filmes de animação americana. “ A Promessa da Virgem” de Kim Hudson busca ser um contraponto a Jornada do Herói, propiciando uma jornada interna, muito comum em filmes independentes e em tramas mais minimalistas. E esses são só alguns casos para exemplificar a imensidão de possibilidades de paradigmas. E de dentro de cada paradigma existem infinitas possibilidades além dos clichês.

O uso de paradigmas em si não é problema, nem a solução para um roteiro. O roteiro ruim que utiliza uma estrutura paradigmática não vai deixar de ser ruim, assim como uma boa história não vai deixar de ser boa por estar enquadrada dentro de um paradigma. O que importa de verdade é a maneira como a roteirista utiliza suas habilidades, referências e conhecimentos para criar a estrutura de sua história. Seja utilizando um paradigma ou não.

Então, antes de demonizar ou glorificar paradigmas, sugerimos que você considere o que pode ser melhor para o seu processo criativo. Também é preciso levar em consideração que cada história tem suas peculiaridades e dialogará de forma diversa com diferentes paradigmas. Mas acima de tudo, vale a pena conhecer os paradigmas e estruturas para avaliar corretamente se algum deles tem a ver com a sua história ou com você.

Ainda está na dúvida, se deve optar ou não por usar um paradigma na construção da sua história? Preparamos o infográfico abaixo para te auxiliar em alguns questionamentos.

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